Começar um negócio sem planejamento societário adequado é um grande erro cometido por muitos empreendedores. Por melhor que seja a ideia dos founders, existem muitas variáveis do próprio negócio que podem comprometer a operação: as vendas podem diminuir por conta de uma pandemia de escala global; o sócio crucial para o negócio pode deixar de se comprometer com a gestão da companhia; seu produto pode estar perdendo espaço para o da concorrência.
E a situação é ainda mais clara quando tratamos de eventos naturais, portanto, previsíveis. Como por exemplo, o falecimento de sócios de sociedades limitadas.
Pois bem, o primeiro ponto a ser entendido quando estamos falando de sociedades limitadas é que o contrato social é que baliza os direitos e deveres dos sócios. É um contrato de caráter pessoal, com vínculo affectio societatis, na medida em que as qualidades dos sócios são determinantes para sua formação.
Um investidor que queira aportar em troca de equity numa companhia está interessado principalmente no capital intelectual dos founders. Do mesmo modo, um engenheiro que se une com um administrador para formar uma construtora, está interessado nas qualidades deste administrador como gestor. Nas grandes companhias, como é o caso das sociedades anônimas, esse vínculo interpessoal é diluído, pouco importando para um acionista individual, em tese, o caráter dos demais acionistas da companhia.
As sociedades limitadas são o tipo societário mais utilizado pelos empreendedores no Brasil. São regidas por contrato social e geralmente se estabelecem com vínculo affectio societatis. Suas notas destoantes e suas vantagens em relação a outros tipos societários podem ser exploradas em outro artigo, no entanto, para desenvolvimento da nossa ideia original, cabe-nos afirmar que nas sociedades limitadas, em razão do vínculo personalíssimo entre os sócios, um planejamento adequado para o caso de falecimento de um destes faz-se mais necessário.
O evento de falecimento, no mundo jurídico, ocasiona a abertura de inventário do patrimônio deixado pelo falecido, compreendendo todos os seus bens e direitos. A participação societária, representada nas quotas sociais, será abrangida no processo de inventário e partilha dos bens, sendo partilhado entre seus herdeiros, na medida do seu quinhão hereditário.
A primeira questão que se impõe na ocorrência do falecimento do sócio é determinar se os herdeiros serão sócios do empreendimento ou se a sua participação será liquidada. Antes da assinatura do contrato social, é importante os sócios serem transparentes sobre essa possibilidade, discutindo entre si se os herdeiros farão parte do negócio numa eventual morte de um dos sócios. Nem sempre o herdeiro terá o perfil desejado pelos fundadores para tocar a companhia, sendo interessante, portanto, o pagamento dos seus haveres na proporção da participação do sócio falecido.
Na ausência de regras expressas, a lei determina que a participação é liquidada, nos termos do artigo 1.028 do Código Civil Brasileiro. O pagamento dos haveres tomará como base na situação patrimonial da sociedade, à data do falecimento, verificando-se o montante em balanço especialmente levantado, conforme determinação expressa do artigo 1.031 do Código Civil.
O balanço avaliará o patrimônio líquido da sociedade, abrangendo capital social, reservas de lucro, lucros ou prejuízos retidos, em conformidade com as normas contábeis vigentes. Nada impede que os sócios, com base na sua autonomia, determinem outro critério para apuração dos haveres, como o de fluxo de caixa descontado, por exemplo. Em geral, esse critério é mais vantajoso para os herdeiros, pois leva em conta a capacidade da companhia de produzir caixa. A permissão para fixar as regras está prevista no artigo 1.031 do Código Civil, que expressamente possibilita livre pactuação entre as partes no contrato social.
Pois bem, além de definir o critério de liquidação das quotas, os sócios devem se preocupar com o prazo de pagamento destes haveres. Isto porque, na ausência de determinação expressa, vale o que prevê a legislação. O Código Civil determina prazo de 90 dias para pagamento em dinheiro, contados da liquidação, no artigo 1.031, §2º.
Consideramos esse prazo, para a maioria dos casos, estreito, ainda mais se se tem em vista a iminente descapitalização da sociedade pelo pagamento destes haveres. O ideal é acordar com o sócio um prazo maior para pagamento desses haveres ou acordar seu parcelamento.
Pois bem, por todo exposto, é fundamental que os sócios não sejam superficiais no planejamento societário e estudem todas essas possibilidades com consultor de sua confiança. Não existe resposta certa para todos, devendo a estratégia ser montada com base na situação familiar e patrimonial de cada um.
Fonte: Conjur.